As alterações na Lei de Improbidade Administrativa podem ser aplicadas retroativamente?

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O Supremo Tribunal Federal (STF) vai definir se as alterações na Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992) inseridas pela Lei 14.230/2021 podem ser aplicadas retroativamente, inclusive quanto ao prazo de prescrição para as ações de ressarcimento, aos atos de improbidade administrativa na modalidade culposa. A matéria, discutida no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 843989, teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual (Tema 1.199).

Trata-se de um caso em que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ajuizou ação civil pública, com o objetivo de condenar uma procuradora, contratada para defender em juízo os interesses da autarquia, ao ressarcimento dos prejuízos sofridos em razão de sua atuação. A procuradora atuou entre 1994 e 1999, e a ação foi proposta em 2006.

O juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido, por considerar que não houve ato de improbidade administrativa, e condenou o INSS ao pagamento de multa por litigância de má-fé, custas processuais e honorários advocatícios. O Tribunal Federal Regional da 4ª Região (TRF-4), contudo, anulou a sentença e determinou a abertura de nova instrução processual.

No recurso ao STF, a ex-procuradora argumenta que a ação seria inviável por ter sido proposta após o prazo prescricional de cinco anos. Sustenta, ainda, que a imprescritibilidade prevista na Constituição (artigo 37, parágrafo 5º) se refere a danos decorrentes de atos de improbidade administrativa, e não a ilícito civil.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do recurso, em sua manifestação, observou que a controvérsia é importante para o cenário político, social e jurídico e que o interesse sobre a matéria ultrapassa as partes envolvidas, reconhecendo a repercussão geral sobre o tema.

Ele explica que, mesmo sem definir se a procuradora atuou com dolo ou culpa, o TRF-4 já antecipou, no julgamento de embargos de declaração, o entendimento sobre a imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento de danos causados ao erário por atos de improbidade administrativa ocorridos após Constituição Federal de 1988. Observou, ainda, que o INSS, no pedido de ressarcimento, atribui à procuradora conduta negligente (culposa) na condução dos processos judiciais.

Vejamos a alteração legislativa trazida pela Lei nº 14.230, de 2021:

Redação anterior:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

 

Nova redação:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: “(Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

Como visto, a Lei incluiu expressamente, a necessidade do requisito dolo para que o ato seja reconhecido como ímprobo.

Segundo ele, a decisão do TRF-4 quanto à imprescritibilidade, somada à ausência de menção a dolo no processo e ao advento da Lei 14.230/2021, que tornou o dolo imprescindível para a configuração do ato de improbidade administrativa, torna necessário que o STF defina se as novidades inseridas na Lei de Improbidade Administrativa devem retroagir para beneficiar quem eventualmente tenha cometido atos de improbidade na modalidade culposa, inclusive quanto ao prazo de prescrição para as ações de ressarcimento.

Para melhor entendimento do caso, destaca-se que a aplicação da lei mais benéfica decorre da Constituição Federal de 1988, que prevê a irretroatividade da lei penal em direito sancionador, salvo para beneficiar o réu (art. 5º, XL, CF). Ou seja, a irretroatividade da lei mais severa (lex gravior) e retroatividade da lei mais benigna (lex militior).

Apesar do princípio constitucional ser focado para o Direito Penal, por se tratar de norma de Direito Administrativo Sancionador, em razão da prática de suposto ato de improbidade administrativa, o princípio constitucional da retroatividade da lei mais benéfica, no caso a Lei nº 14.230/2021, poderá ser aplicado ao campo administrativo sancionador.

Isto porque, a retroatividade da lei mais benigna se insere em princípio constitucional com aplicabilidade para todo o exercício do jus puniendi estatal, se inserindo para a suposta aplicação Lei de Improbidade Administrativa.

Além disso, o artigo 1º, §4º, da Lei nº 8.429/1992, incluído pela alteração legislativa trazida pela Lei nº 14.230, de 2021, traz informação relevante para que se depreenda da aplicação da nova lei aos casos que já estão em curso. Neste particular:

Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

 

  • Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

A Lei de Improbidade Administrativa, enquanto produto do ius puniendi estatal, integra o Direito Administrativo Sancionador.

Não havendo maiores diferenças entre normas penais e normas administrativas sancionadoras, que fazem parte do poder punitivo estatal, o § 4º do art. 1º, da Lei 14.230/2021, expressamente ressaltou a aplicação imediata dos princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador.

Precisamos aguardar se este será o entendimento do STJ sobre o tema.

Enquanto isso, com o reconhecimento da repercussão geral, o ministro Alexandre de Moraes decretou que se suspenda, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o processamento dos Recursos Especiais em que for suscitada, ainda que por simples petição, a aplicação retroativa da Lei 14.230/2021. Ele considera a medida necessária para evitar juízos conflitantes com a futura decisão do Supremo.

Processo relacionado: ARE 843989

Fonte: STF – Supremo Tribunal Federal:

https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=483329&ori=1

Por Ana Luiza Figueira Porto.

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